Código Florestal: fim de pauta ou pauta sem fim?
Poucos temas ganharam relevo e despertaram tanto interesse no Congresso Nacional como ocorreu com a Reforma do Código Florestal. Há pelo menos 13 anos que o tema é discutido nos meios de comunicação e mais recentemente nas redes sociais. Em 18 de outubro último, a presidente Dilma vetou nove pontos da Medida Provisória 571/2012, editada para preencher os vazios deixados pelos vetos no novo Código Florestal, sancionado pela presidente no primeiro semestre deste ano.
A ministra do Meio Ambiente, em tom efusivo,disse que a discussão sobre o Código Florestal doravante é uma página virada, pois segundo ela, “ninguém mais aguentava essa polarização”.
A declaração da ministra revela o quanto foi tenso o debate em torno de um tema, que aparentemente ficaria restrito a um público seleto, entretanto, alcançou grande audiência polarizando distintas perspectivas de desenvolvimento. O debate desnudou a voracidade de amplas parcelas do agronegócio presente na Câmara dos Deputados.
A tramitação da Reforma do Código Florestal é mais um capítulo da reação dos ruralistas às conquistas presentes no ordenamento jurídico brasileiro, inovador e contemporâneo com os desafios da necessária compatibilidade entre produção e preservação. O avanço no texto constitucional, no que tange à pauta ambiental, se inscreve como parte das inúmeras vitórias, fruto das mobilizações sociais que culminaram na Constituição de 1988.
Ademais, o Brasil, gradativamente, não obstante os governos de distintas orientações políticas, sintonizou-se e, muitas vezes, esteve na vanguarda mundial em relação ao conceito de desenvolvimento sustentável. Esse consenso começou a cindir a partir do momento em que os ruralistas conquistaram inédita representação na Câmara dos Deputados, formando praticamente um partido político com agenda própria, direção e programa.
Os ruralistas atuam com desenvoltura, interferem na composição da mesa diretora e das comissões da Câmara dos Deputados, especialmente as de seus interesses. Estão no governo e na oposição, são simultaneamente moderados e radicais. Os membros do “partido ruralista” que apoiam o governo habilmente,bloqueiam - pela negociação - as iniciativas do governo que estão mais próximas àsustentabilidade ambiental; os da oposição, tencionam ao máximo e, apesar das conquistas obtidas, permanecem insaciáveis.
A vitória alcançada pelos ruralistas na reforma do Código Florestal revela, contudo, o fosso entre eles e a sociedade brasileira, que em pesquisas de opinião e nas mobilizações em torno da campanha “Veta, Dilma!” expressou opinião contrária à anistia aos desmatadores e à redução das áreas de proteção permanente – APP. A Campanha “Veta, Dilma!” conquistou ampla adesão social, sendo considerada por muitos analistas políticos um fenômeno social.
Esse fenômeno social pode estar de, alguma maneira, influenciando a pesada campanha de markenting promovida pelo agronegócio, visando a reconstruir sua imagem arranhada, devido à truculência e ao desprezo de parcela dos ruralistas presentes no Congresso Nacional. Os vetos parciais da presidente Dilma apenas mitigaram os impactos negativos. Em que pese o texto final do Código Florestal terficado mais à imagem e a semelhança dos interesses dos ruralistas, algumas de suaslideranças ainda questionarão a validade de pontos da Medida Provisória no Supremo Tribunal Federal (STF).
Outras lideranças ruralistas, essas “100% satisfeitas”, miram na regulamentação do Código Florestal, bem como se articulam para reduzir as unidades de conservação, avançar nas terras indígenas e quilombolas, impedir qualquer revisão dos índices de produtividade para efeito de reforma agrária, a ampliação dos limites para a compra de terras por estrangeiros no país.
Aliada a essas pautas, soma-se a ampliação dos projetos de mineração e dehidrelétricas na região amazônica, que faz parte da lógica perversa de enxergar o Brasil meramente como exportador de matéria-prima. Longe de ser uma “página virada”, o Código Florestal é uma página que antecipa as fortes ameaças a que estão submetidas comunidades tradicionais e seus territórios, como alvo da voracidade de um modelo de desenvolvimento.
Gilberto Sousa
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